Crime de dispensa ilegal de licitação exige prova de dolo e de dano ao erário
Para a configuração do crime de dispensar ou declarar a inexigibilidade de licitação fora das hipóteses legais (artigo 89 da Lei 8.666/1993) é preciso haver a presença do dolo específico de causar dano ao erário e do efetivo prejuízo à administração pública.
Com esse entendimento, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca determinou o trancamento de ação penal ajuizada pelo Ministério Público do Paraná contra uma babá acusada de participar de fraude para burlar as exigências da Lei de Licitações.
Segundo o processo, ela trabalhava como babá e depois foi registrada como recepcionista na empresa de seus patrões, os quais – aproveitando-se de sua ingenuidade – colocaram seu nome no quadro de sócios da firma e a induziram a assinar documentos cujo conteúdo desconhecia. Os documentos teriam sido usados para propiciar a prática do crime previsto no artigo 89, parágrafo único, da Lei de Licitações (dispensa ou declaração de inexigibilidade em desacordo com as normas legais).
A defesa da babá alegou não haver o dolo exigido para tipificar o delito imputado. Afirmou também que a conduta seria acobertada pela excludente de culpabilidade, pois ela não seria capaz de compreender a natureza de suas ações.
Sem previsão
As alegações não foram aceitas pelas instâncias de origem, que negaram o pedido de absolvição sumária, sob o entendimento de que não haveria necessidade de demonstração do dolo específico, uma vez que o dispositivo legal não traz tal previsão, diferentemente de outros artigos da mesma lei que utilizam as expressões “com o intuito de”, “com o fim de” ou ” a fim de”.
Para as instâncias ordinárias, o dolo está na mera dispensa ou na afirmação de que a licitação é inexigível fora das hipóteses previstas em lei.
Intenção e prejuízo
Ao analisar o recurso da defesa, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca destacou que tanto a jurisprudência do STJ quanto a do Supremo Tribunal Federal (STF) consideram que o crime previsto no artigo 89 da Lei 8.666/1993 exige, para sua caracterização, a intenção de causar lesão ao erário e a comprovação de que houve prejuízo ao ente público.
“Tais condições constituem elementares do tipo penal, devendo estar presentes para fins de tipicidade da conduta”, afirmou o ministro.
Ele disse que “os tipos penais previstos na Lei 8.666/1993 não têm por objetivo criminalizar a mera inobservância de formalidades legais para a contratação com o poder público, mas, sim, o descumprimento com a intenção de violar os princípios cardeais da administração pública”.
No caso analisado, Reynaldo Soares da Fonseca salientou que não foi possível identificar no processo as circunstâncias exigidas pela jurisprudência do STF e do STJ para a caracterização do crime por parte da babá utilizada como laranja – o que impõe o encerramento da ação penal por ausência de justa causa.
Leia a decisão.
Fonte: STJ. Acessado em: 06/05/2020.